GESTÃO DE RISCO

A LPBC/ FT estabelece a obrigação que tem toda entidade obrigada de elaborar por escrito documentos ou registos que detalhem os riscos inerentes à realidade operativa específica da entidade obrigada e a adequação dos meios e procedimentos de controlo destinados à mitigação desses riscos, bem como a forma como a entidade obrigada monitoriza a sua adequação e eficácia.

Esses documentos são elaborados em função dos parâmetros previamente definidos pela entidade obrigada após a realização de uma análise de risco.

A LPBC/FT estabelece uns critérios de risco que devem ter em conta todas as entidades obrigadas (por exemplo, países ou territórios de origem dos clientes da entidade obrigada, áreas de negócio desenvolvidas…). Junto com estes riscos comuns, cada entidade obrigada deve ter em conta os seus próprios riscos. Por exemplo:

  • Recebe fundos de clientes que lidam com muito dinheiro em numerário?
  • Os seus clientes são na sua maioria residentes no estrangeiro?
  • Qual é o montante médio das suas operações?

POLÍTICA DE ACEITAÇÃO DE CLIENTES

Forma parte do sistema de controlo interno o desenvolvimento de políticas e procedimentos e controlos em matéria de aceitação de clientes e de cumprimento do quadro normativo aplicável. Estas politicas definem:

  1. Os critérios e factores a considerar na avaliação do risco associado a um cliente em matéria de branqueamento de capitais e de financiamento do terrorismo.
  2. A definição das eventuais medidas que devem ser adotadas em função da classificação atribuída e as circunstâncias ou fatores que podem sustentar a decisão de não aceitação do cliente e/ou da operação.

MEDIDAS DE DILIGÊNCIA DEVIDA

O dever de identificação e diligência consiste na obrigação de as entidades obrigadas observarem procedimentos de identificação e diligência relativamente aos clientes, aos respetivos representantes e aos beneficiários efetivos. Estas atuações permitem à entidade obrigada conhecer quem é o seu cliente. A LPBC/ FT define este procedimento.

As medidas normais de indentificação e diligência são:

  • Identificação dos clientes e dos respetivos representantes (solicitar os elementos identificativos previstos no artigo 24.º da Lei).
  • Identificação dos beneficiários efetivos (pessoa física que controla uma empresa ou sociedade).
  • Conhecer o propósito da relação de negócios.

À hora de definir e aprovar as medidas de diligência devida, as entidades obrigadas devem determinar que documentação é necessária para o seu cumprimento, excepto nos casos específicos em que a normativa determine que documentos são considerados documentos válidos.

Estas medidas não são só uma compilação de documentos, devem buscar uma coerência entre o nosso cliente e a operação que pretende realizar. Portanto, atendendo aos riscos detetados na análise de risco prévia, as entidades obrigadas devem definir e desenhar as medidas de diligência devida.

Igualmente, junto com as medidas de diligência normais, as entidades obrigadas devem determinar que medidas reforçadas serão de aplicação a aqueles clientes cujo risco seja superior à média (denominados clientes de risco alto).

As medidas de diligência (normais ou reforçadas, no caso) aplicar-se-ão tanto ao cliente final da operação como a qualquer pessoa que possa intervir (garante, mutuante, doador, etc.), dado que, neste terceiro, pode concorrer algum elemento de risco que faça necessária uma análise mais exaustiva da operação no seu conjunto.

As medidas de diligência devida deveraõ ser aplicadas:

  1. Antes de iniciar a relação de negócios com o cliente (sem prejuízo do disposto na Lei para as medidas simplificadas).
  2. Enquanto perdure a relação de negócios. Neste caso, a entidade obrigada será quem determine em que prazos devem ser aplicadas novamente todas ou determinadas medidas de diligência devida, tendo sempre em conta as disposições legais ao respecto.

LEMBRE:

As medidas de diligência devida podem ser normais, simplificadas e reforçadas. Serão aplicadas:  

a) Ao cliente final e antes de ejecutar a operação.

b) Ao cliente final antes de iniciar a relação de negócios e no decorrer da mesma, até a execução da operação, conforme aos procedimentos aprovados pela sociedade.

c) A qualquer interveniente na operação desde que se conheça a sua existência (por exemplo, desde que se conheça que existe um mutuante privado)

Antes de começar a relação de negócios ou, durante o transcurso desta, devem aplicar-se uma série de medidas (procedimentos de execução do dever de identificação e diligência) tanto ao cliente como à operação.

A aplicação destas medidas permitem à entidade obrigada detetar possíveis elementos de risco que deverão ser examinados através de um procedimento específico (dever de exame).

Finalizado o exame da operação, as entidades obrigadas, podem decidir:

  1. Executar a operação, quando não existam suspeitas de estar perante uma operação vinculada com o branqueamento de capitais ou financiamento do terrorismo. Por sua própria iniciativa, também podem informar de imediato o Departamento Central de Investigação e Ação Penal da Procuradoria-Geral da República (DCIAP) e a Unidade de Informação Financeira sempre que saibam, suspeitem ou tenham razões suficientes para suspeitar que certos fundos ou outros bens, independentemente do montante ou valor envolvido, provêm de atividades criminosas ou estão relacionados com o financiamento do terrorismo.
  2. As entidades obrigadas comunicam também, numa base sistemática, ao DCIAP e à Unidade de Informação Financeira quaisquer tipologias de operações que venham a ser definidas através de portaria do ministro responsável pela área da justiça, a qual define igualmente a forma, o prazo, o conteúdo e os demais termos das comunicações.

A LPBC/FT estabelece nos artigos 2.º a 7.º o seu âmbito de aplicação, identificando as entidades obrigadas, às quais se aplica uma série de medidas de obrigado cumprimento.

Particularmente, as entidades obrigadas devem:

  • Adotar medidas de caráter interno tais como a definição e aplicação de políticas e procedimentos internos.
  • Designar responsáveis da execução do dever de controlo e responsáveis pelo controlo do cumprimento normativo.

SISTEMA DE CONTROLO INTERNO

O artigo 12.º da LPBC/FT prevê o dever das entidades obrigadas de definir e assegurar a aplicação efetiva das políticas e procedimentos e controlos, proporcionalmente à sua natureza, dimensão e complexidade. Alguns destes são:

  • Definir um modelo eficaz de gestão de risco; programas de formação contínua dos colaboradores; ferramentas ou sistemas de informação adequados ou meios internos que permitam aos colaboradores comunicarem eventuais violações da lei.
  • Desenvolver políticas e procedimentos em matéria de aceitação de clientes e cumprimento normativo, assim como políticas em matéria de proteção de dados pessoais..
  • Instituir sistemas e processos formais de captação, arquivo e tratamento da informação; canais seguros para a preservação da confidencialidade dos pedidos de informação; procedimentos de averiguação no processo de contratação de colaboradores; mecanismos de controlo da atuação dos colaboradores e mecanismos que permitam testar a qualidade, eficácia e adequação destas políticas, procedimentos e controlos.
  • Designar um responsável pelo controlo do cumprimento do quadro normativo aplicável.
  • Análise e tomada de decisões pelas estruturas internas relevantes; e exercício dos deveres de comunicação e colaboração.

Divulgar informação atualizada e accesível aos colaboradores em matéria de PBC/FT.

  1. No mesmo sentido, as entidades obrigadas devem identificar, avaliar e mitigar os concretos riscos de branqueamento de capitais e de financiamento do terrorismo existentes no contexto da sua realidade operativa específica.
  2. A mesma Lei dispõe no artigo 14.º que, caso os riscos específicos inerentes a um dado setor de atividade sujeito à aplicação da lei sejam claramente identificados e compreendidos, as autoridades setoriais podem, através de regulamentação, dispensar a realização de avaliações de risco individuais e documentadas ou permitir que as mesmas sejam realizadas em termos simplificados, a definir pela respetiva autoridade e/ou estabelecer os procedimentos alternativos à realização das avaliações de risco individuais ou simplificadas.

DESIGNAÇÃO DOS ÓRGÃOS DE CONTROLO

O artigo 13.º da LPBC/FT prevê que as autoridades sectoriais poderão exigir às respetivas entidades obrigadas que designem um membro do órgão de administração responsável pela execução do disposto na própria lei e na regulamentação que a concretiza, sem prejuízo da responsabilidade individual e colegial dos demais membros do órgão de administração.

   

   

IMPORTANTE:

Mesmo que possam existir algumas exceções neste ponto para determinados setores, não implica que não se devam aplicar as medidas de execução do dever de identificação e diligência que estudaremos nas próximas lições.

CÓDIGO PENAL

O branqueamento de capitais constitui um crime, previsto no artigo 368.º-A do Código Penal. Este artigo estabelece que será punido por branqueamento de capitais “quem converter, transferir, auxiliar ou facilitar alguma operação de conversão ou transferência de vantagens, obtidas por si ou por terceiro, direta ou indiretamente, com o fim de dissimular a sua origem ilícita, ou de evitar que o autor ou participante dessas infrações seja criminalmente perseguido ou submetido a uma reação criminal”, também “quem ocultar ou dissimular a verdadeira natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou titularidade das vantagens, ou os direitos a ela relativos” e quem “não sendo autor do facto ilícito típico de onde provêm as vantagens, as adquirir, detiver ou utilizar, com conhecimento, no momento da aquisição ou no momento inicial da detenção ou utilização, dessa qualidade“.

Da mesma forma, a tentativa e a negligência são sempre puníveis, se a pessoa responsável ignora o dever de cuidado que lhe resulta exigível favorecendo de maneira indirecta ao autor do crime. Esta punibilidade encontra-se prevista na Lei 83/2017, no seu artigo 164.º. Por exemplo: um comercial que, na venda de um imóvel, sabe que a pessoa interessada em comprá-lo vai fazer o pagamento dessa operação com fundos que provêm de uma actividade ilícita e, mesmo assim, permite que continue com a operação evadindo os mecanismos de controlo interno da sua empresa.

Convém referir que as pessoas coletivas e entidades equiparadas, com exceção do Estado, de pessoas coletivas no exercício de prerrogativas de poder público e de organizações de direito internacional público, poderão ser responsáveis pelo crime de branqueamento de capitais, em conformidade com o disposto no artigo 11.º do Código Penal.

LEGISLAÇÃO ADMINISTRATIVA

Em Portugal, além de punir o branqueamento de capitais como um crime no Código Penal, encontramos a Lei n.º 83/2017, de 18 de agosto, que estabelece medidas de combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo.

A legislação portuguesa encontra a sua origem nos standards internacionais promovidos pela Organização das Nações Unidas (ONU) e o Grupo de Ação Financeira / Financial Action Task Force (GAFI / FATF). No ano 1990, o GAFI publicou 40 Recomendações, com o objetivo de constituir um esquema de medidas que os paises pudessem implementar para combater o branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo. Estas recomendações foram objeto de várias revisões. A última atualização das mesmas foi efetuada em fevereiro de 2023.

No ano 2005, a União Europeia promulgou a Diretiva 2005/60/CE com base nas 40 Recomendações do GAFI. Esta diretiva foi transposta em Portugal no ano 2008, dando origem à Lei n.º 25/2008, de 5 de junho, que veio alterar profundamente o sistema nacional de prevenção e combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo.

O 5 de junho de 2015, foi publicado no Jornal Oficial da União Europeia (JOUE) a Diretiva 2015/849, que foi transposta para o direito nacional através da Lei n.º 83/2017, de 18 de agosto. Esta Lei também transpõe a Diretiva 2016/2258/UE, do Conselho, de 6 de dezembro de 2016, e revoga a Lei n.º 25/2008, de 5 de junho.

 

Finalmente, no ano 2018 a União Europeia aprovou a Diretiva 2018/843, regulando novas questões na matéria. A Lei n.º 58/2020, de 31 de agosto, transpõe esta Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de maio de 2018 que, por sua vez, altera a Diretiva (UE) 2015/849.

LEMBRE:

A principal normativa em matéria de PBC/FT é a seguinte:

– Lei n.º 83/2017, de 18 de agosto, de medidas de combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo.

– Lei n.º 58/2020, de 31 de agosto, que transpõe a Diretiva (UE) 2018/843 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de maio de 2018, que altera a Diretiva (UE) 2015/849 relativa à prevenção da utilização do sistema financeiro para efeitos de branqueamento de capitais ou de financiamento do terrorismo e a Diretiva (UE) 2018/1673 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2018, relativa ao combate ao branqueamento de capitais através do direito penal, alterando a Lei n.º 83/2017 e o Código Penal.

– Diretiva (UE) 2015/849 relativa à prevenção da utilização do sistema financeiro para efeitos de branqueamento de capitais ou de financiamento do terrorismo (actualizada com as suas diversas modificações).

Nos seguintes links podemos encontrar a normativa completa:

As políticas em matéria de prevenção do branqueamento de capitais (PBC), surgiram no final da década de 1980 como reação à crescente preocupação suscitada pela criminalidade financeira derivada do tráfico de drogas. Em Portugal, as políticas de Prevenção e Combate ao Branqueamento de Capitais e Financiamento do Terrorismo (doravante AML e FT) foi desenvolvida em linha com a evolução das normas internacionais nesta matéria, normas nas quais Portugal tem participado activamente como membro do Grupo de Ação Financeira – GAFI (Financial Action Task Force – FATF).

A normativa prevê, entre outras obrigações, a participação de dirigentes, colaboradores e agentes em acções de formação específicas sobre AML e FT. Este curso permite o cumprimento do dever de formação, dotando o participante das competências e habilidades necessárias para o cumprimento das normas vigentes de PBC e FT no desenvolvimento das suas funções profissionais.